Desculpem, mas não resisti...
Uma transcrição (com cortes) do último comentário de MST n´"A Bola". Ainda bem que as minhas crónicas são anteriores, senão ainda passaria por plagiador...
Os comentários entre parentesis e a decisão de marcar certas frases são, obviamente, da minha responsabilidade.
"Aconteceu-me o que não era suposto poder acontecer a quem se considera quase viciado em futebol: adormeci durante a final do Mundial (também eu)! Acabou assim, sem beleza, e decidido a penalties como não podia deixar de ser aquele que foi, provavelmente, o pior Mundial de todos os tempos (onde é que já vi isto?). Pior ainda do que o Coreia-Japão, onde os génes do vírus que parece ter-se instalado na maior competição futebolística do mundo já eram evidentes, para quem os quisesse ver. Não sei a quantos mais mundiais destes poderá o futebol resistir, mas seria bom que as cabeças pensantes percebessem que não resistirá eternamente.
O que faz do futebol o espectáculo mais popular do mundo é a sua simplicidade de meios, de regras e de objectivos. Jogar futebol, gostar de ver jogar futebol, é a coisa mais natural e instintiva que existe num ser humano: basta uma bola e um jogador de cada lado e é possível ter futebol. Mas, seja com dois ou com vinte e dois, num campo de terra ou num relvado perante 70.000 espectadores, nenhum jogador e nenhum espectador se contenta com um tipo de jogo que se limite a fazer circular a bola de uns para os outros, sem nenhum outro objectivo que não fazer passar o tempo, à espera de um deslize do adversário ou do desempate por penalties. O futebol foi inventado para que as pessoas se divirtam a ver ou a jogar. Não para que adormeçam em frente à televisão, morram de tédio nas bancadas ou de impotência em campo. Sem golos e sem liberdade para os artistas, não existe futebol apenas a caricatura científica dele, que nos vendem como resultado de grande trabalho, grande competência e grande modernidade.
O que aconteceu na Alemanha foi o triunfo do resultadismo, a imagem de marca deste Mundial.Todos eles Brasil, Argentina, Alemanha, Inglaterra, França esperaram poder ganhar o Mundial através da mesmíssima fórmula posta em campo pelos italianos: o mínimo de riscos, o mínimo de desgaste, o mínimo de improviso, o mínimo de liberdade concedida aos artistas, próprios ou alheios. Ganhou a Itália, pois, porque nesse tipo de jogo é ainda a melhor.
Quem foi o melhor jogador do Mundial? Resposta adequada: ninguém. Não houve um só jogador que se destacasse de forma clara e regular, ninguém que tenha sido autor de uma só jogada de que nos lembremos daqui a um mês.
Não houve um só jogo de encher o olho, um só que fique para sempre associado à memória deste Mundial. O melhor marcador da prova não foi além de cinco golos facturados. E a imagem que ficará a marcar este Mundial (para além da excelente organização alemã, que é justo recordar) é a desgraçada cabeçada de Zidane em Materazzi.
Aparentemente preocupada com o que viu e com os comentários que foi ouvindo, a FIFA anunciou agora que vai fazer um seminário de reflexão com os treinadores das 32 selecções presentes para tentarem perceber porquê que se viu tão pouco futebol de qualidade neste Mundial. É assim como se a policia, preocupada com os assaltos a bancos, chamasse os chefes das principais quadrilhas de assaltantes para discutir as medidas a adoptar.
Toda a gente sabe que a fraca qualidade deste futebol é obra directa dos treinadores resultadistas, os teóricos do futebol de «expectativa e contenção», da «coesão defensiva», da «circulação de bola», da «redução de espaços» e da «consistência», que põem todas as equipes a jogar igual, as boas e as más, as que têm grandes jogadores de ataque e as que não têm: todas a jogar em 40 metros de campo, todas a defender atrás da linha da bola, como no andebol, todas reduzidas a um único avançado de raiz. Por isso, e primeiro que tudo, o que a FIFA deveria fazer era juntar os 32 treinadores com algumas velhas glórias do futebol, ex-treinadores de equipas que fizeram história e representantes do público, para que estes explicassem àqueles que, a continuar assim, nem os mundiais nem o futebol têm grande futuro.
Mas, acima de tudo, o que é urgente e necessário é lançar uma campanha pública à escala global de defesa e promoção do futebol-espectáculo contra o futebol resultadista. E isso não é só à FIFA que cabe fazer: começa aqui, nas páginas da imprensa desportiva (ou do blog)."
Duque de Espadas
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