O Caso Mateus – a minha visão
Em relação ao “caso Mateus”, tentarei dar uma opinião técnica, num esforço para com o meu humilde contributo elucidar certas dúvidas que possam subsistir, pese embora as constantes dualidades do Direito, ciência muito pouco exacta.
O jogador tinha um contrato como amador no anterior clube, o Lixa F.C. Por incrível que possa parecer, um internacional angolano que marcou presença no Mundial estava com um contrato como contínuo neste clube, auferindo no papel cerca de 350€. Ora, urge punir estes clubes que contornam a lei das formas mais saloias possíveis, mas continuam as nossas instituições desportivas a assobiar para o lado. Adiante.
A legislação desportiva prevê um período nunca inferior a um ano para que um amador possa assinar um contrato profissional. Outro enorme absurdo do legislador, pois se por hipótese, o Benfica estiver interessado num jogador da terceira divisão, o pobre atleta só poderá ir após um ano. E qual o fim da norma? Se alguém souber que me explique… Acresce que se me afigura inconstitucional e contrária às normas laborais, pois impede o livre acesso do trabalhador ao trabalho.
Nesta circunstância, o Gil Vicente não poderia inscrever o jogador por não ter cumprido o período de um ano, mas o clube contesta a não inscrição, recorrendo aos órgãos jurisdicionais da LPFP que não dão razão ao Gil Vicente. Com o jogador impedido de jogar o G.V. recorre aos tribunais administrativos que mandam suspender a decisão da Liga de não aceitar a inscrição.
Finda a época desportiva, o Belenenses que nunca tinha levantado objecções a nada e contra quem o jogador não jogou, resolve a reboque de alguns jornais desportivos, ressuscitar o problema. Mas como legitimade moral não se confunde com legitimidade jurídica...
Os órgãos de justiça desportiva da Liga e da FPF, condenam -muito tardiamente e aqui está a génese do drama - o GV a descer de divisão por ter recorrido aos tribunais comuns. A questão que se coloca? Poderia o GV fazê-lo? No meu modesto entendimento, sim. A lei desportiva diz que não podem os clubes recorrer aos tribunais para obter a resolução de questões desportivas. Mas será esta uma questão desportiva? Não creio. Quanto a mim, julgo tratar-se de matéria de direito administrativo, pois não estamos a falar da bola que bate no poste, mas da inscrição ou não de jogadores. Para além de que a FPF é uma pessoa colectiva de direito público que delega poderes na Liga, estando ambas sujeitas às normas administrativas. Por último, julgo tratar-se de uma norma inconstitucional, pois violadora de preceitos fundamentais da CRP, que se prendem com o direito de todas as pessoas recorrerem às instâncias judiciais disponíveis.
Eis a razão porque Tribunal Administrativo de Lisboa deu razão ao GV na providência cautelar por este intentada.
Tudo estaria bem se por aqui ficasse, mas agora surge a FIFA, qual Padrinho do futebol mundial dizer “na minha coutada ninguém manda, só nós”, ameaçando os clubes portugueses com a suspensão das competições europeias.
Andam mal estes ditadores se pensam que é assim que se resolvem as coisas num estado de direito. A FIFA tem que perceber que não pode ter regulamentação interna que colida com a Constituição dos países e com as normas comunitárias. Tem de compreender que não há tribunais desportivos. Logo, se o GV der seguimento ao processo, julgo que teremos um novo Ac.Bosman, agora Ac. Gil Vicente.
Mas como isto iria demorar muito tempo, com consequências irreparáveis a curto, médio prazo, creio que a única solução que a Liga tem é alargar a competição aos dois clubes, resolvendo mal, mas dado o arrastar da primeira decisão, da forma menos penosa possível.
Para não ser ainda mais fastidioso (não consegui encurtar mais), vou ficar por aqui, prometendo voltar em breve ao assunto.
Duque de Espadas
Sem comentários:
Enviar um comentário