quarta-feira, novembro 28, 2007

In DN

REQUIEM POR ESMERALDA João Miguel TavaresJornalistajmtavares@dn.pt

É mais fácil um camelo passar pelo buraco de uma agulha do que algum dos envolvidos no caso Esmeralda vir a entrar no reino dos céus. Esta história é como as tragédias de Shakespeare: nela não se encontra um único inocente, todos carregam consigo alguma forma de culpa, e por isso é tão difícil acreditar que o caso ainda possa vir a ter um final feliz.Têm culpa o sargento Luís Gomes e Adelina Lagarto, os pais afectivos de Esmeralda, porque acharam aceitável arranjar uma filha através de um negócio feito à beira da estrada. Hoje pagam pela irresponsabilidade da decisão, de contornos mais do que duvidosos e nunca inteiramente esclarecidos, tomada a 28 de Maio de 2002. E pagam também por, a seu tempo, terem impedido qualquer aproximação do pai biológico à criança, contribuindo para o extremar de posições.Tem culpa Aidida Porto, a mãe biológica de Esmeralda, por ter entregue a filha como entregou, e um ano depois já a estar a reclamar de volta. Em todo este processo, Aidida andou sempre empurrada, consoante os ventos que sopravam dos tribunais e da comunicação social, e já disse tudo e o seu contrário.Tem culpa Baltazar Nunes, o pai biológico de Esmeralda, porque descobriu a paternidade num tubo de ensaio que lhe foi posto à frente. Depois, fascinado pelos seus próprios espermatozóides, transformou todo este caso numa obsessão pela posse da filha, como se ela fosse um bibelô que se muda de uma casa para outra, sem dores. Tivesse ele um pingo de bom senso e este poderia ter sido um exemplo de persistência. Assim, é apenas um caso de teimosia, orgulho e egoísmo.Tem culpa, acima de todos estes, a justiça portuguesa. A culpa da demora. A culpa da falta de equilíbrio. A culpa da arrogância. Embora Baltazar só se tenha lembrado de que queria ser pai quando a filha já tinha nove meses, o certo é que anda desde 27 de Fevereiro de 2003 a solicitar a regulação do poder paternal. Já lá vão, portanto, 57 meses de decisões judiciais absurdas, onde o interesse de Esmeralda foi sendo triturado por uma justiça cega, lenta e insensível, que quer fazer nascer um novo pai de acórdãos obscuros, ao ponto de os técnicos que seguem a criança terem decidido saltar fora do processo. Por tudo isto, o melhor mesmo talvez seja atribuir a culpa à própria Esmeralda. A terrível e definitiva culpa de ter nascido. Alivie-se de uma vez a consciência de todos os intervenientes no processo, e que ela faça como na Canção Desnaturada de Chico Buarque - volte depressa para a escuridão do ventre da sua mãe, de onde, para descanso da nossa justiça, nunca deveria ter saído.

Aqui fica uma visão pertinente de todo o caso esmeralda.

Bisca de Copas

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