quarta-feira, fevereiro 15, 2006

Carta Aberta

Caríssimo,
Reparei que ou não estudaste bem a lição ou maldosamente (o que me recuso a acreditar) omitiste uma parte do estudado. É que esqueceste-te de referir que a ala liberal pertencia ao partido único do regime, a Acção Nacional Popular e tinham assento na Assembleia Nacional- o parlamento fictício do Estado Novo.
É certo que enquanto Cunhal, Alegre, etc… carpiam as agruras do cárcere e outros como Soares eram forçados a exilar-se no estrangeiro (será que era isto que querias dizer com o estar ausente no 25 de Abril???), esta ala liberal sofria internamente (não fisicamente) por sentir que pertencia ao regime, e porventura até acharás que é comparável. Lamento dizer-te, não é.
Pensei que pudesses descobrir algum nome da luta antifascista que me tivesse olvidado, mas tal como suspeitei, nem um. Por uma razão muito simples: contra todos os complexos tratou-se de uma revolução da esquerda, ainda que suportada por todos os portugueses.
Mas de suportar e estar presente na Assembleia Nacional, vai uma grande distância para lutar como Salgueiro Maia e Vasco Gonçalves na rua, Alberto Martins nas revoltas estudantis de Coimbra ou Jorge Sampaio nas de Lisboa. Até em minha casa houve quem a quisesse mas nenhum lutou por ela.
Para não individualizarmos um grupo de pessoas, dizemos que foi o Povo. No entanto, os Heróis têm nome como os atrás referidos e não se confundem com a massa anónima a que apelidas de Povo. Uns pertencem ao Povo porque estavam longe dos centros de decisão, outros por medo, outros porque “lutavam” na Assembleia Nacional… Todos estes são Povo.
As prisões, as torturas, a conspiração organizada, o exílio (ler “Álvaro Cunhal, uma biografia política” de José Pacheco Pereira). Isto foi a revolução. É a história, é fácil de confirmar.
Que afirmasses que houve homens de direita com influência no pós 25 de Abril, até é aceitável. Todavia isso é o pós. E o pós significa depois.
Quanto ao que fizeram a Soares, tens razão, não tem explicação. Ou melhor tem uma: falta de memória.
Acredito não ter compreendido o alcance das tuas palavras e por isso suponho que dirás agora que tudo o que afirmaste foi uma piada, como a do Freitas do Amaral – tão fina, tão fina, que saiu à francesa pela porta dos fundos…
Com os melhores cumprimentos, desta carta amiga sempre ao dispor,

Duque de espadas

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