sexta-feira, janeiro 19, 2007



Salazar

O facto de António Oliveira Salazar figurar entre os dez maiores portugueses deixou meio país surpreendido e gerou algum desconforto. Devo dizer que encarei essa escolha sem nenhuma surpresa, considerando-a até bastante previsível. Reconheço que ainda há muitos portugueses vivos com saudades do Portugal provinciano e do respeitinho. Porém, custa-me a perceber quando este saudosismo vem de pessoas jovens e instruídas!

Se reconheço algum mérito a Salazar, ainda responsável pela pasta das finanças, pelo saneamento das nossas contas públicas, o que se passou a seguir foi algo absolutamente desastroso para o nosso país. Ainda hoje estamos a pagar a factura de quarenta anos de ditadura e isolamento em atraso económico e social. O que era o nosso Portugal nos idos tempos da ditadura? Portugal era um país predominantemente rural e as condições de vida da grande maioria da população eram absolutamente miseráveis. A população rural era pobre, não tinha acesso aos cuidados básicos de saúde, a instrução quando existia ficava-se pela escola primária, a carência de alimentos era uma realidade, os momentos de lazer eram uma utopia! Em contrapartida havia uma elite restrita e endinheirada. Eram estes privilegiados que tinham acesso ao ensino superior, aos cuidados de saúde, à cultura e ao lazer. Portugal era um país terceiro mundista em que a ascensão social não ocorria porque não havia oportunidades. Diz-se hoje que o nosso país é assimétrico e desigual, como é que seria nesses tempos?

O Portugal da ditadura não era livre, havia uma corrente de pensamento oficial e quem se lhe oposesse tinha os calabouços de Caxias ou na pior das hipóteses o Tarrafal à sua espera. A censura servia para calar os assuntos incómodos ao regime e para manter os portugueses à parte da modernidade do mundo ocidental. A PIDE encarregava-se de afastar, torturar ou matar quem defendesse um Portugal livre e verdadeiramente democrático. Só existia um partido político, o voto não era universal e o escrutínio das votações podia ser adulterado de acordo com a conveniência do regime.

Nunca se soube qual era a visão e a estratégia que Salazar tinha para as colónias. O ilustre professor tinha medo de andar de avião e não tenho ideia de alguma visita oficial às colónias! Qual era o conhecimento que ele teria da realidade? O que lhe relatavam certamente. O império colonial era para manter por manter. Se Salazar tivesse uma maior capacidade estratégica talvez poupasse os nossos jovens a uma sangrenta guerra sem objectivo algum. A sua intransigência e falta de tacto político mergulhou Portugal numa guerra estúpida e sem saída possível. Se o processo de descolonização tivesse seguido uma via pacífica e negociada, talvez hoje o nossos países irmãos não nos envergonhassem por figurarem nos últimos lugares do índice de desenvolvimento humano!

Quais as saudades que me deixa um homem assim, obviamente nenhumas.

Bisca de Copas

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